sábado, 6 de setembro de 2008

Alma animal

Onde, em mim, cala fundo o abandono de animais ou supostas injustiças que, ao meu olhar, fere a dignidade animal? Não sei se cometo blasfêmia ao falar de “dignidade animal”, mas quero me referir ao direito de se estar vivo e de não se ser enganado na mais primitiva inocência, que é a de acreditar no que se vê, no que se sente e pressente. Uma dignidade que é comum a qualquer animal, filho de bicho homem ou de bicho bicho.
Sempre me pega de surpresa atitudes intempestivas, explosões de raiva ou ações vingativas. Quando sou atingida por uma situação dessas, me sinto igualada aos animais irracionais, que não podem entender a complexidade do cérebro humano (ou, como queiram os mais românticos, a complexidade das emoções, do “coração”).
Sinto-me um perfeito cachorrinho assustado, com o rabo entre as pernas e fazendo xixi de tanto medo... Não adianta, não consigo me habituar aos destemperos, às manifestações extremadas de ódio.
Ao sentir pena de um cão sarnento abandonado (mas não precisa ser sarnento não, às vezes é até muito bem tratado, mas absolutamente solitário, privado de matilha original e da “matilha humana”), sinto, na verdade, pena de mim mesma, privada do amor-primeiro, fiel, incondicional e perene. Estarei com nostalgia do Paraíso?
O cachorro que abana o rabo à chegada do seu dono e recebe um pontapé como resposta é igual a mim quando, no encontro amigo, sinto e pressinto hostilidade.
Não estou querendo entender ou julgar os outros, mas a mim mesma. E a pergunta que não quer calar é: onde, em mim, cala fundo o abandono de animais? Por que não reajo, não vocifero e não dou o troco? Ou, como um cão raivoso, ataco, mordo e dilacero até que a carne se torne viva e sangrenta?
Acho que é porque eu e o cão sarnento somos feitos de outra espécie. Abnegados? Acho que não. Pura bondade? Também não, pois cometo minhas maldedezinhas de vez em quando. Continuarei buscando a resposta. Enquanto isso, me irmano aos animais e continuo a perguntar: quanto de animal há em minha alma?

Descrição da foto

No plano de fundo (atrás) está destroços de uma casa. À frante, se vê uma criança bem pequena (3 ou 4 anos), um cachorrinho ainda filhote e um velho sentado em uma cadeira. A criança corre atrás do cachorrinho e o velho os observa. A criança e o velho têm traços asiáticos.

3 comentários:

Fábio Adiron disse...

Katia

Toda manifestação de sensações e sentimentos é mais do que uma "ínfima contribuição"

Parabéns e vida longa ao Dor e delícia (que sempre seja mais delícia do que dor...)

Abraço

Fábio Adiron

Anônimo disse...

Salut Katia,

J´ai beaucoup aimé ton blog. Tu es vraiment courageuse de te lancer dans cette aventure. J´espère que tu auras l´aide nécessaire pour continuer ton travail mais cette aide ne viendra sûrement pas de moi car je suis "burríssma" quand il s´agit de l´ordinateur. Vamos nos unir, nos os cachorros abandonados e solitários que não entendem a ferocidade da humanidade!

Gros bisous et bon courage

Denise

Anônimo disse...

Por enquanto o Dor e Delícia é mais delícia do que dor.
Gostei dos escritos que encontrei por aqui. O dinamismo e leveza dos textos não lhe tira o conteúdo de fundo, que percebe-se, baseado em conhecimentos filosóficos e profundo exercício de vida.
Parabens pela criatividade das fotos, pela abrangência informativa dos conteúdos e pela dança poéticas das palavras.
Geraldo Nogueira